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quarta-feira, 20 de março de 2019

VOLTA A PRIMAVERA! / SPRING!

PRIMAVERA!

Quando vier a Primavera,

Se eu já estiver morto, 
As flores florirão da mesma maneira 
E as árvores não serão menos verdes que na Primavera passada. 
A realidade não precisa de mim. 

Sinto uma alegria enorme
Ao pensar que a minha morte não tem importância nenhuma 
Se soubesse que amanhã morria 

E a Primavera era depois de amanhã, 
Morreria contente, porque ela era depois de amanhã. 
Se esse é o seu tempo, quando havia ela de vir senão no seu tempo? 
Gosto que tudo seja real e que tudo esteja certo; 
E gosto porque assim seria, mesmo que eu não gostasse. 
Por isso, se morrer agora, morro contente, 
Porque tudo é real e tudo está certo. 

Podem rezar latim sobre o meu caixão, se quiserem. 
Se quiserem, podem dançar e cantar à roda dele. 
Não tenho preferências para quando já não puder ter preferências. 


O que for, quando for, é que será o que é. 

Fernando Pessoa (Alberto Caeiro)

terça-feira, 19 de março de 2019

Fernando Pessoa - "Pecado original" / "Original sin"


"PECADO ORIGINAL"

Ah, quem escreverá a história do que poderia ter sido? 
Será essa, se alguém a escrever, 
A verdadeira história da humanidade. 

O que há é só o mundo verdadeiro, não é nós, só o mundo; 
O que não há somos nós, e a verdade está aí. 
Sou quem falhei ser. 
Somos todos quem nos supusemos. 

A nossa realidade é o que não conseguimos nunca. 
Que é daquela nossa verdade o sonho à janela da infância? 
Que é daquela nossa certeza o propósito a mesa de depois? 

Medito, a cabeça curvada contra as mãos sobrepostas 
Sobre o parapeito alto da janela de sacada, 
Sentado de lado numa cadeira, depois de jantar. 

Que é da minha realidade, que só tenho a vida? 
Que é de mim, que sou só quem existo? 
Quantos Césares fui! 
Na alma, e com alguma verdade; 
Na imaginação, e com alguma justiça;
Na inteligência, e com alguma razão 

Meu Deus! meu Deus! meu Deus! 

Quantos Césares fui!
Quantos Césares fui! 
Quantos Césares fui!

Fernando Pessoa

quinta-feira, 10 de abril de 2014

Fernando Pessoa - Várias citações



"Tenho pensamentos que, se pudesse revelá-los e fazê-los viver, acrescentariam nova luminosidade às estrelas, nova beleza ao mundo e maior amor ao coração dos homens."


"Ninguém entende ninguém. Tudo é interstício e acaso, mas está tudo certo."



"Quem não vê bem uma palavra não pode ver bem uma alma."


sexta-feira, 15 de novembro de 2013

Fernando Pessoa

"A criança que fui chora na estrada.
Deixei-a ali enquanto vim ser quem sou;
Mas hoje, vendo que o que sou é nada,
Quero ir buscar quem fui onde ficou.

Ah, como hei-de encontrá-lo? Quem errou
A vinda tem a regressão errada.
Já não sei de onde vim nem onde estou.
De o não saber, minha alma está parada.

Se ao menos atingir neste lugar
Um alto monte, de onde possa enfim
O que esqueci, olhando-o, relembrar

Na ausência, ao menos, saberei de mim,
E, ao ver-me tal qual fui ao longe, achar,
Em mim um pouco de quando, era assim"

(Fernando Pessoa, 22-09-1933)

sexta-feira, 28 de dezembro de 2012

Fernando Pessoa

"Para todos nós descerá a noite e chegará a diligência. Gozo a brisa que me dão e a alma que me deram para gozá-la... Se o que deixar escrito no livro dos viajantes puder, relido um dia por outros, entretê-los também na passagem, será bem. Se não o lerem, nem se entretiverem, será bem também..."

..."Nestas impressões sem nexo, nem desejo de nexo, narro indiferentemente a minha autobiografia sem factos, a minha história sem vida. São as minhas Confissões, e, se nelas nada digo, é que nada tenho que dizer. Que há-de alguém confessar que valha ou que sirva? O que nos sucedeu, ou sucedeu a toda a gente ou só a nós; num caso não é novidade, e no outro não é de compreender."

Fernando Pessoa (O livro do desassossego)

domingo, 10 de abril de 2011

A Verdade


"Encontrei hoje em ruas, separadamente, dois amigos meus que se haviam zangado um com o outro. Cada um me contou a narrativa de porque se haviam zangado. Cada um me disse a verdade. Cada um me contou as suas razões. Ambos tinham razão. Ambos tinham toda a razão. Não era que um via uma coisa e o outro outra, ou que um via um lado das coisas e outro um lado diferente. 
Não: cada um via as coisas exatamente como se haviam passado, cada um as via com um critério idêntico ao do outro, mas cada um via uma coisa diferente, e cada um, portanto, tinha razão."


Fernando Pessoa, "O Livro do desassossego"